Em meio ao desolador cenário de devastação com que Michel Temer se
deparou, em meados de maio, ao assumir a Presidência da República, a
reconstrução da Petrobras afigurava-se como um dos maiores desafios a
enfrentar. Passados pouco mais de quatro meses, é auspicioso constatar que o
penoso e complexo processo de recuperação da Petrobras está bem encaminhado. Há
um longo caminho a trilhar, mas o esforço de reconstrução contemplado parece
promissor.
Um
avanço crucial nesse esforço foi o compromisso do governo de abandonar de vez o
controle de preços de derivados, dando por encerrado o longo período de
populismo que tanto custou à Petrobras.
Em declarações recentes, o presidente
da empresa, Pedro Parente, tem procurado não deixar dúvida sobre a extensão
dessa recém-conquistada autonomia da estatal: “(...) não precisamos fazer
mudanças de preços já. Mas também não precisamos perguntar a ninguém se
decidirmos que temos de mudar” (“O Estado de S.Paulo”, 21/9).
Ter
a Petrobras se livrado da manipulação populista de seus preços não é um fato
menor. Merece comemoração. Quanto a isso, não há o que discutir. O que, sim,
merece discussão é que uso a Petrobras pretende dar à liberdade de fixar preços
que agora supostamente tem.
Ninguém
em sã consciência defenderia que uma empresa com o gigantesco poder de
monopólio que ainda tem a Petrobras possa fixar seus preços nos níveis que bem
entender.
O que aponta para a necessidade de que a empresa se paute por uma
política transparente e defensável de preços. Até porque, sem isso, será
difícil evitar que a liberdade de preços duramente conquistada volte a ser
perdida no futuro. Um risco do qual a empresa precisa urgentemente se livrar.
O
que deveria nortear tal política? Não há muito o que inventar. Na medida do
possível, preços internos de derivados de petróleo deveriam estar alinhados aos
preços vigentes no mercado internacional. A própria administração atual da
Petrobras parece concordar com isso. Mas como ir além de meras e vagas
promessas de alinhamento? Como implementar, na prática, uma política de
vinculação efetiva dos preços internos de derivados aos preços externos?
Há
muitos anos venho defendendo a instauração de um sistema transparente de gestão
dessa política de vinculação, que facilite o acompanhamento da lógica das
decisões tomadas e a avaliação dos resultados obtidos. Voltando a fazer amplo
uso do direito de autoplágio, reproduzo abaixo a essência da argumentação em
defesa dessa proposta que apresentei em artigo publicado nesse mesmo espaço, em
8/11/2013, sob o título “Uma política de preços para a Petrobras”.
Não
faz sentido reduzir a ideia de vinculação à mera atrelagem mecânica do preço
interno de cada derivado a um preço de referência externo. A política de
vinculação que interessa exige análise mais ampla, tendo em conta amplo
espectro de preços e a evolução do mercado internacional de petróleo como um
todo. O que pode ser bem mais complexo do que se pensa.
O
desafio de dar transparência a decisões discricionárias especialmente complexas
e, ao mesmo tempo, permitir a avaliação contínua da qualidade dessas decisões
vem sendo enfrentado, com razoável grau de sucesso, na política de metas para a
inflação. Talvez se deva extrair dessa experiência lições importantes para a
política de preços de derivados. O que parece estar faltando nessa política é
algo similar ao Relatório de Inflação, por meio do qual o Banco Central
explicita seus diagnósticos e premissas e justifica suas decisões, expondo-as à
avaliação pública.
Não
parece ser demais exigir que a cada três ou quatro meses a Petrobras publique
documento similar, justificando detalhadamente sua política de preços de
derivados, à luz da evolução do mercado internacional de petróleo e da meta
regulatória de alinhar preços internos aos preços internacionais. É uma
iniciativa relativamente simples que permitiria tornar a política de preços de
derivados menos ruidosa, mais consequente e mais previsível.
fonte: Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio
Nenhum comentário:
Postar um comentário