Os "moscas brancas"
São
Paulo - O descompasso entre oferta e procura por mão de obra altamente
especializada não é novidade no Brasil. Mas, em algumas carreiras, este apagão
de mão obra qualificada atinge níveis ainda mais preocupantes.
De
tão raros, alguns profissionais são apelidados de "moscas brancas"
pelos recrutadores. O termo se refere aquele tipo profissional que de tão
especializado (e demandado) raramente está disponível no mercado. Se é que ele
existe, em alguns casos.
Levantamento
feito pela consultoria EXEC para EXAME.com mostra quais são os profissionais
mais raros, atualmente, do mercado brasileiro.
Petróleo e Gás: Engenheiros e Técnicos para
Upstream
A
cadeia produtiva de óleo e gás, como um todo, vive um cenário de descompasso
entre oferta e procura por profissionais. Mas, de acordo com o levantamento da
EXEC, encontrar mão de obra especializada para a atuação nos poços de petróleo
é ainda mais difícil.
“Todo
tipo de engenheiro que está envolvido em upstream (que é a perfuração de poços)
está muito valorizado”, afirma Carlos Eduardo Altona, sócio-diretor da EXEC. O
gargalo está na formação, altamente especializada, mas não somente.
“Este
profissional fica muito tempo nas plataformas, por isso, você precisa de um
público mais jovem”, diz o especialista. Em outras palavras, profissionais que
estejam dispostos a passar longos períodos longe da terra firme.
Construção: Gerentes e Diretores de Incorporação
com foco na captação de terrenos
A
expansão do mercado imobiliário se, por um lado, tornou mais robustos os cofres
das incorporadoras, por outro, tornou a disponibilidade de espaços para novas
construções ainda mais diminuta.
Por
isso, para encontrar esses locais é preciso um olhar clínico e muita
experiência. Resultado? Faltam profissionais capazes de identificar este tipo
de área. “Os diretores de incorporação com foco em captação de terrenos têm uma
visão ampla do mercado e são conectados para saber onde estão as áreas
disponíveis”, afirma Altona.
Mas
isso não é tudo. O profissional que atua neste tipo de cargo precisa ter um bom
relacionamento com as prefeituras das cidades dos terrenos em questão e uma
elevada capacidade de negociação.
“Tem
que ter um perfil comercial, negociador. Tem que gostar de negócios.
Normalmente, este profissional é criado e formado em uma incorporadora”, afirma
o especialista.
Geração de energia: gerentes e engenheiros de obras
Para
os projetos de geração de energia, o gargalo está no nível de especialização
que esta missão requer. De acordo com Rodrigo Forte, sócio-diretor da EXEC,
dois tipos de profissionais são requeridos, porém raramente encontrados para
esses megaempreendimentos.
Um
deles é o engenheiro civil com experiência em grandes obras. O outro, o
engenheiro mecânico, que tem a missão de instalar turbinas, geradores e todos
os outros elementos para a geração e distribuição de energia.
Mas
o caráter técnico não é o único fator que torna esses profissionais raros no
mercado. “Essas obras são implantadas em locais isolados. Eles precisam estar dispostos
a ficar bastante isolados por um tempo”, diz Forte.
Segundo
o especialista, o cenário complica ainda mais quando os projetos englobam novas
modalidades de energia, como a eólica. “O Brasil é muito tradicional em
hidroenergia, quando você parte para outras formas, não há tantos profissionais
capacitados”, afirma.
Agronegócio: Gerentes Agrícolas
A
chegada de empresas multinacionais ao mercado sucroalcooleiro no Brasil deu um
chacoalhão nas usinas tupiniquins. Até então, as empresas do setor eram formatadas
em modelos de gestão tipicamente familiares. Com o novo cenário, tiveram que se
profissionalizar.
E
os gerentes agrícolas ganharam um papel de destaque nesta nova fase.
"Estima-se que entre 60% a 70% do custo operacional de uma usina é a área
agrícola. É aí que se consome mais investimento”, afirma Forte, da EXEC. Com
isso, uma estratégia mal direcionada no campo e pronto: bilhões de dólares
desperdiçados.
“O
gerente agrícola é responsável por buscar a melhor produtividade com o menor
custo. Ele tem a responsabilidade técnica sobre um orçamento muito grande”,
afirma o especialista.
O
trabalho vai desde selecionar o tamanho da área a ser cultivada a determinar
quais espécies de cana de açúcar serão plantadas, passando por escolha de
fertilizantes de noções de condições climáticas. “É uma área com muitas
variáveis”, diz Forte. Fatores suficientes para incluir os gerentes agrícolas
na lista dos moscas brancas dos recrutadores.
Gerentes de Planejamento Tributário (impostos
indiretos)
Diante
de uma das cargas tributárias mais complexas do mundo, as multinacionais que
acabam de desembarcar no Brasil estão, literalmente, à caça de profissionais
especializados em planejamento tributário que saibam tudo sobre impostos
indiretos.
“Os
impostos indiretos são aqueles que incidem sobre as operações”, diz Altona, da
EXEC. “O entendimento desta legislação pode mudar desde a composição de um
produto até a localização de centros de distribuição”.
Para
desempenhar este papel, o profissional deve entender muito do negócio em
questão e saber, em detalhes, toda a legislação. Além, é claro, de inglês
fluente (para atender as multinacionais) e capacidade de fazer planejamento
tributário estratégico.
“As
empresas, no Brasil, não têm uma cultura de planejamento tributário”, diz o
especialista. Mas, com este profissional, podem economizar, dentro da lei,
milhões de reais.
Gerentes de Planejamento Tributário: planejamento
internacional outbound
Mais
e mais companhias nacionais estão desembarcando operações em outros países. “Do
ponto de vista tributário, as companhias precisam saber como constituir essas
novas operações de modo a economizar impostos”, diz Altona.
Por
isso, cresce a demanda por profissionais especializados em planejamento
tributário que saibam tudo sobre as peculiaridades do sistema tributário dos
países destino. “Como você aprende isso? Na prática. Geralmente, essas pessoas
tiveram uma formação fora do Brasil”, afirma.
Tecnologia: Gerentes de Vendas para América Latina
Nos
últimos anos, o Brasil virou a sede de muitas empresas com operação na América
Latina. “Isso é muito visível na indústria de tecnologia, mas há poucos
executivos que tenham uma real experiência no desenvolvimento de negócios para
a América Latina”, diz Forte.
Resultado?
Faltam profissionais que compreendam as peculiaridades de cada país latino
americano, saibam desenvolver estratégias de negócios de acordo com essas
diferenças, tenham espanhol fluente e, principalmente, profundos conhecimentos
de tecnologia.
Tecnologia: Engenheiros especializados em cloud
computing
Até
pouco tempo atrás, apenas promessas de um futuro promissor embalavam as
decisões de quem decidia se especializar em computação em nuvem.
Os
tempos mudaram (na velocidade da luz) e, hoje, engenheiros que saibam
desenvolver aplicativos para dispositivos móveis e para a nuvem estão mais do
que em alta no mercado.
De
acordo com os especialistas, cada vez mais busca-se engenheiros com um bom
background técnico e conhecimentos em cloud computing. “É uma evolução da
internet que temos hoje”, diz Altona.
Tecnologia: Gerentes de Serviços
“Cada
vez mais a tecnologia é uma commodity e os vendedores precisam estar preparados
para vender não só o produto, mas a solução como um todo”, diz o especialista.
Nesse quesito, os gerentes de serviços de tecnologia assumiram um papel
essencial na pré e pós-venda.
“Eles
estão assumindo uma abordagem consultiva para customizar a solução da companhia
para a necessidade do cliente”, afirma. Na prática, tecnologia não é suficiente
para atender a esta demanda. É preciso compreender, com profundidade, os
negócios dos clientes para propor as melhores soluções.
“Ele
tem que entender do produto, das possibilidades e também do negócio dos
clientes”, diz.
Educação/Editorial: Gerentes de Vendas
“O
mercado de educação cresce muito no Brasil. Há empresas estrangeiras comprando
universidades e o governo que, bem ou mal, cada vez mais cria programas para
investir em educação”, diz Altona. “É um mundo de oportunidades”.
Mas
faltam gestores com experiência no setor e capazes de desenvolver negócios com
o governo. “O executivo precisa conhecer a secretaria de educação, as leis
específicas e ter uma atuação sofisticada em marketing”, afirma o especialista.
Fonte: Exame, 27 de abril de 2012