O grupo J&F, que controla a JBS, gastou nos últimos dois
anos R$ 2,1 milhões em patrocínio de eventos do IDP (Instituto Brasiliense de
Direito Público), que tem como sócio o ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo
Tribunal Federal).
Ao ser questionado pela Folha sobre o assunto, o instituto
disse que devolveu R$ 650 mil deste total no dia 29 de maio, após a revelação
do acordo de delação premiada de executivos da empresa.
O IDP diz que, em razão de uma cláusula contratual
relacionada à conduta ética e moral por parte do patrocinador, rescindiu um
contrato assinado em 11 de junho de 2015 com o grupo.
Segundo a faculdade, os recursos foram destinados a cinco
eventos, "além do suporte a um grupo de estudos em Direito do Trabalho, da
concessão de bolsas de estudo para estudantes carentes e egressos do sistema
prisional, cursos gratuitos para a comunidade".
De acordo com o IDP e a JBS, um dos congressos incluídos nos
patrocínios ocorreu em abril, em Portugal, pouco mais de uma semana depois de
sete executivos do frigorífico firmarem um acordo de delação com o Ministério
Público Federal. Participaram daquele encontro magistrados, ministros do
governo de Michel Temer, além de advogados e políticos.
A JBS, por meio da assessoria de imprensa, diz que gastou R$
1,45 milhão desde 2015, sem mencionar a devolução de R$ 650 mil. A empresa cita
três congressos patrocinados, sendo o último realizado em Portugal, neste ano,
no valor de R$ 650 mil.
A delação foi homologada pelo ministro Edson Fachin no STF,
relator do caso, que decidiu levar ao plenário do tribunal um recurso do
governador do Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB), que contesta sua
relatoria. Ou seja, o colegiado do qual Gilmar faz parte terá que tomar decisão
sobre a delação. Não há ainda data para esse julgamento.
Em maio, Gilmar defendeu que a homologação da delação fosse
discutida pelo plenário. O acordo tem sido alvo de críticas por supostas
fragilidades em relação a penas dos envolvidos.
No dia 27 de maio, reportagem da Folha informou que a
família de Gilmar vende gado no Mato Grosso para o frigorífico –segundo ele, as
negociações são encabeçadas pelo irmão. O ministro diz que não havia motivo
para se declarar impedido de participar de votações sobre assuntos envolvendo a
empresa.
Na ocasião, a reportagem o questionou sobre encontro que
teve com o empresário Joesley Batista, delator e um dos sócios da JBS que
gravou secretamente o presidente Temer e o senador Aécio Neves (PSDB-MG).
Gilmar confirmou a reunião, ocorrida, segundo ele, a pedido
do advogado Francisco de Assis e Silva, outro delator da empresa. Joesley, de
acordo com Gilmar, apareceu de surpresa. A reunião, diz o ministro, tratou de
questão referente a um julgamento do STF sobre o setor de agronegócio.
A data da conversa, segundo Gilmar, é posterior a 30 de
março, quando o tribunal realizou um julgamento sobre o Funrural, fundo
abastecido com contribuições de produtores rurais à previdência.
O IDP anunciou a presença do presidente Temer em um
seminário patrocinado pelo governo. De acordo com a programação, Temer
participará da cerimônia de abertura do seminário, marcado para os dias 20 e 21
de junho.
O evento é chamado de "7º Seminário Internacional de
Direito Administrativo e Administração Pública-Segurança Pública a Partir do
Sistema Prisional". O anúncio no site da faculdade de Gilmar estampa
propaganda da Caixa e o logo oficial do governo. O banco informou à Folha que
vai repassar R$ 90 mil de patrocínio. O ministro e a faculdade negam conflitos
de interesse –alegam que a Caixa patrocina eventos do instituto desde 2011.
OUTRO LADO
O IDP afirmou que até a delação, "a conduta das
empresas do grupo J&F era considerada exemplar", inclusive como
relevantes patrocinadores de iniciativas acadêmicas e culturais de inúmeras
instituições públicas e privadas.
"As ofertas de patrocínio, para qualquer empresa, são
formuladas pela administração e pelo jurídico do IDP, por escrito. A exposição
da marca é sempre decisão unilateral do patrocinador", disse o instituto.
Sobre os R$ 650 mil devolvidos em maio, o IDP diz que os
recursos chegaram depois da realização do evento. E, por isso, como não foram
gastos, foram devolvidos.
Por meio da assessoria, Gilmar disse que "não é, nem
nunca foi, administrador do IDP. Sendo assim, não há como se manifestar sobre
questões relativas à administração do instituto". E citou as regras
previstas na legislação sobre possível impedimento dele em julgamentos.
A assessoria da JBS não respondeu a diversas questões feitas
pela Folha: quem fez os pedidos em nome do IDP, se houve alguma solicitação por
parte de Gilmar e se a JBS costuma patrocinar eventos de outras faculdades.
Fonte: Marlene Bergamo -8.jun.2017/Folhapress
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